Sem Chão | Crítica Sem Chão | Crítica

Sem Chão | Crítica

Um Retrato devastador da resistência palestina
Divulgação

O cinema documental, quando utilizado com honestidade e urgência, tem o poder de transcender a mera exposição de fatos e transformar-se em um registro histórico essencial. Sem Chão (No Other Land), que disputa o Oscar de Melhor Documentário em 2025 e já coleciona impressionantes 62 prêmios em festivais internacionais, é um desses filmes que desafiam a indiferença. Dirigido coletivamente por Yuval Abraham, Basel Adra, Hamdan Ballal e Rachel Szor, a obra é um testemunho cru e angustiante da resistência palestina em Masafer Yatta, na Cisjordânia, contra o avanço implacável da ocupação israelense.

Sem Chão | Crítica

Filmado ao longo de cinco anos, o documentário tem como eixo central o trabalho do ativista e jornalista palestino Basel Adra, que registra meticulosamente as demolições e os desmandos militares que assolam sua comunidade. Masafer Yatta, um conjunto de vilarejos ao sul da Cisjordânia, tem sido alvo de ordens de expulsão desde 1981, e a obra não se furta a expor o impacto devastador desse processo: casas reduzidas a escombros, famílias separadas, vidas fragmentadas. As imagens são desconcertantes – não há cenários de guerra convencionais, mas sim uma destruição silenciosa e sistemática, que escancara um processo de apagamento de um povo, de uma cultura, de uma história.

O que diferencia Sem Chão de outros documentários sobre o conflito israelense-palestino é a sua abordagem íntima e profundamente humana. A relação entre Basel Adra e Yuval Abraham, um jornalista israelense, se torna um dos fios condutores da narrativa. A proximidade entre os dois permite ao filme explorar o abismo entre suas realidades: enquanto Basel vê sua terra natal se esvair, Yuval, como cidadão israelense, goza de direitos e proteções que seu colega jamais terá. O choque entre essas perspectivas não apenas humaniza o conflito, mas também denuncia a assimetria brutal de poder.

O filme chega em um momento de extrema tensão geopolítica. Seu lançamento coincide com o cessar-fogo entre Hamas e Israel e o agravamento da crise no Oriente Médio, intensificada por declarações políticas controversas. Em meio a discursos polarizados e narrativas distorcidas, Sem Chão apresenta um olhar despido de manipulações retóricas e se concentra nas vozes daqueles que pagam o preço mais alto: os habitantes de Masafer Yatta, que veem suas casas destruídas e sua existência ameaçada em nome de interesses geopolíticos.

O impacto emocional do documentário é avassalador. Há sequências que desafiam o espectador a manter-se impassível, como os depoimentos de moradores que enfrentam a incerteza de um amanhã. Mas nenhum momento se compara ao registro final de Basel, uma cena que ressoa como um grito sufocado de resistência, um último apelo para que o mundo não desvie o olhar.

Com distribuição da Synapse Distribution, Sem Chão estreia no Brasil em 13 de março, prometendo não apenas um filme, mas uma experiência transformadora. É um documento essencial sobre injustiça e sobrevivência, um filme que não pede licença para existir, mas sim exige ser visto, discutido e lembrado.

5

EXCELENTE

É um documento essencial sobre injustiça e sobrevivência, um filme que não pede licença para existir, mas sim exige ser visto, discutido e lembrado.