Tanto no universo da Marvel e da DC Comics existe uma lacuna que não é sempre explicada: o que aconteceram com os heróis depois da Segunda Guerra Mundial. Em A Era de Ouro, da Sociedade da Justiça, James Robinson (Liga da Justiça, Starman) decidiu contar essa história no Universo DC. Como eles foram afetados pela paranoia anticomunista, o macarthismo e os ideais do pós-guerra.
Para aqueles que não estão familiarizados com a história dos quadrinhos de super-heróis: o primeiro ápice dos quadrinhos foi durante a Segunda Guerra. Nesse período se vendeu tantos quadrinhos que ele é considerado a Era de Ouro. Esse período começa em 1938, com a publicação da Action Comics #1 – revista que conta a história inicial do Superman – e vai até 1954, com a publicação da Sedução dos Inocentes, livro que culpa os quadrinhos pela delinquência juvenil e coloca pais e professores contra a Nona Arte. Os super-heróis, porém, entram em decadência com o fim do conflito, diminuindo até os únicos sobreviventes serem a Trindade: Superman, Batman e MulherMaravilha.
Diferente da Marvel, cujos heróis foram criados em sua maioria nos anos 1960, a DC Comics sempre teve o problema de explicar o que aconteceu entre o fim da Segunda Guerra e a aparição dos novos heróis. Ou porque os heróis da Era de Ouro, como o Lanterna Verde, o Flash, o Homem-Gavião e o resto da Sociedade da Justiça não entraram no conflito. A explicação clássica era a Lança do Destino, artefato que permitiria que Hitler controla-se qualquer meta-humano que entrasse na Europa.
A Era de Ouro e a aposentadoria da Sociedade da Justiça
Em A Era de Ouro, James Robinson começa contando outra versão para essa história. Hitler possuía, além de alguns meta-humanos capazes de enfrentar os americanos, um chamado Parsifal, que conseguia anular os poderes de qualquer ser super poderoso ao seu redor. O presidente Roosevelt, considerando que a morte de qualquer super-herói seria um duro golpe para a moral americana, proíbe a Sociedade da Justiça e outros seres super poderosos de ir para o Velho Mundo. Isso não impediu os heróis de tentarem a sorte, e tomarem umas surras.
Depois da Guerra, os heróis acabam sendo cada vez mais esquecidos. Eles começam a envelhecer e se aposentar, e as pessoas perdem o interesse neles, afinal, não foram eles que venceram a guerra. Exceto por um, Tex Thompson, o Mr. América, que foi um dos grandes heróis do conflito. Ele volta, é saudado como herói e entra para a política.
James Robinson não tem medo de enveredar pela política do período. Ele fala sobre o macarthismo, a paranoia da anticomunista e como alguns homens usaram isso para tentarem ascensão política. Na história, um deles é Thompson, que decide criar o super-herói da nova América, o jovem Daniel Dunbar, que se torna Dínamo, com poderes de super-força, resistência e voo.
Acompanhamos, tal qual os Estados Unidos da época, os heróis decaindo física e moralmente, o maior retrato é Dunbar, cada vez mais imerso no vício da cocaína e agindo mais e mais estranhamente. Ou Thompson, que decide se tornar presidente dos Estados Unidos, não importa o preço. Algo de muito errado está acontecendo, algo que vai forçar a Sociedade da Justiça a sair das sombras para salvar o dia, uma última vez.
James Robinson cria o Watchmen dos heróis clássicos da DC
Impossível não traçar paralelos entre A Era de Ouro e Watchmen. São ambas séries adultas, que tratam sobre o ocaso dos super-heróis de seu tempo. Ambas apresentam sexo, drogas e muita violência.
Enquanto Alan Moore usa os heróis da Charlton Comics para criar um final para os super-heróis, James Robinson usa A Era de Ouro para contar o fim da história da Sociedade da Justiça. Só que diferente do primeiro, e seu final cheio de desesperança, Robinson termina a sua história com a passagem de tocha, dos antigos para os novos. Os tempos precisam continuar, mesmo que tenha chego a hora dos velhos cruzados aposentarem a capa.
A história é tecnicamente brilhante. Usa vários efeitos para se mostrar como algo antiga, como o documentário no início, que lembra os noticiários que passavam no cinema na década de 1940-50. Outro recurso usado é um dos heróis fazendo um documentário sobre sua época, o que ajuda a explicar a situação atual.
A arte de Paul Smith (X-Men, X-Factor) é muito boa, evita os exageros musculosos dos anos 1990 para um estilo mais clássico, condizente com a trama. Na arte, porem, quem se destaca é o colorista Richard Ory (American Flagg), com cores pastéis, que por vezes lembram lápis de cor, que combinam com a trama. A arte ficou vintage, com cara retrô, mas que também não fica velha. Em nenhum momento você vai achar que está lendo um quadrinho da década de 1950, mas sim uma homenagem muito bem feita a eles.
A Era de Ouro é uma grande história. Divertida, interessante, que trata de temas adultos, com um subtexto político e histórico. Se você se interessa por isso, pela história dos quadrinhos, ou só sobre o universo da DC Comics, vale muito a pena.