Sair da sua zona de conforto costuma ser uma experiência enriquecedora. A partir dessa ação, surgem caminhos claros: os que podem agregar à sua jornada e aqueles que é melhor evitar. Em Oh, Canadá, o diretor Paul Schrader (Gigolô Americano) entende esse movimento como uma chance de ampliar o leque de recursos visuais para contar uma história melancólica. No entanto, mesmo com boas intenções ao subverter a forma de conduzir a narrativa, ele se perde na própria ambição de ser “único”, resultando em uma obra confusa e sem alma.
Acompanhamos as últimas horas de Leonard Fife (Richard Gere), um dos sessenta mil fugitivos e desertores que se refugiaram no Canadá para não servir no Vietnã, e que agora compartilha seus maiores segredos com ex-alunos de faculdade para um documentário. Confuso, debilitado e cansado de guardar essas memórias apenas para si, ele exige a presença da esposa Emma (Uma Thurman) durante a entrevista, para que ela ouça a desmistificação de sua vida — tão engrandecida e respeitada por muitos. Entre idas e vindas ao passado, vemos o jovem Leonard, interpretado por Jacob Elordi, ressaltar suas falhas como ser humano e questionar uma vida à qual ele já não pertence.
A proposta de desconstruir o “mito” criado em torno de um personagem é de fato interessante, especialmente quando o filme adota uma estética documental. Os monólogos de Richard Gere prendem a atenção de qualquer um pela força de sua presença em cena. A deterioração de um artista, seja física ou psicologicamente, soa quase poética ao refletirmos se suas conquistas ou títulos foram mesmo merecidos — principalmente quando o filme flerta com a metalinguagem. Mas, assim como deve ser doloroso ver uma mente brilhante se desintegrar, Oh, Canada demonstra ser uma obra que sufoca em criatividade, perdendo rapidamente sua mensagem e propósito.
Tudo é artificial, quase como se os personagens — que deveriam ser o ponto mais importante — se tornassem apenas folhas em branco, com pouquíssimo conteúdo. Nada ali parece importar, pois em nenhum momento a história se preocupa em mostrar as consequências dos atos de Leonard. Nada de fato parece encaixar: é como tentar inserir uma peça triangular em um objeto redondo. Não deveria estar ali, mas, por algum motivo, Paul Schrader insistiu na ideia de que o público se apegaria aos personagens principais.
A falta de aprofundamento em temas como refugiados de guerra, a complexidade das relações amorosas, a vulnerabilidade através do cinema e o real significado da palavra “verdade” mostra que essa história tinha potencial. Porém, o que predomina é a sensação de falta de capricho na revisão do roteiro, como se ele tivesse sido reescrito várias vezes e por pessoas diferentes. Nem mesmo os diálogos extraídos do livro original de Russell Banks, de mesmo título, conseguem dar sustentação ou enriquecer a trama.
A impressão final é que Oh, Canadá pretende ser um filme de premiações, tentando se colocar em um patamar artístico elevado — seja por querer se distanciar dos outros filmes ou por acreditar que essa história é genuinamente interessante. No final, torna-se apenas uma obra prepotente, repleta de excessos e sem inspiração para abordar seus temas políticos ou sociais. Às vezes, menos é mais — e é uma pena que o filme tenha entendido exatamente o oposto.
Com distribuição da California Filmes, Oh, Canadá chega aos cinemas de todo o país no dia 5 de junho.
Ruim
Recheado de prepotência e mensagens vazias, Oh, Canada é o claro exemplo de como excessos podem prejudicar um filme.