Quer os autores gostem ou não, Hollywood muda muito do material original ao levar uma história para a telona. Sem contar que quando um escritor vende os direitos de uma obra sua, ele pode ser propositalmente deixado de fora do processo de adaptação, o que pode gerar muito desgosto em relação ao produto final.
Alguns dos escritores desta lista acharam que a adaptação cinematográfica de seu trabalho arruinou o livro, que o filme perdeu o tom do romance, destruiu o final ou foi mal interpretado. Teve autor que até chorou quando viu o filme.
Confira essas polêmicas adaptações cinematográficas e o que cada autor pensou sobre o que fizeram com sua obra.
Mary Poppins (1964)
Adaptação do livro: Mary Poppins (1934)
Autora: P. L. Travers
A famosa briga envolvendo Mary Poppins foi tão pesada que foi transformada no filme Walt nos Bastidores de Mary Poppins, estrelado por Tom Hanks como Walt Disney e Emma Thompson como P. L. Travers. Por 20 anos, Travers teve a intenção de não deixar a Disney colocar as mãos em seu trabalho, mas problemas financeiros fizeram com que ela cedesse.
Durante a produção, quase todas as ideias de Travers foram recusadas. Ela odiava que a Mary Poppins do filme não fosse tão rigorosa com as crianças, odiou todas as cenas de animação, a música e até o elenco. Sim, ela odiava Julie Andrews. A Disney estava tão assustada com o quanto Travers desprezava o filme que ela não foi convidada para a estreia. Apesar disso, ela conseguiu um convite, e supostamente chorou durante a maior parte do filme.
O Iluminado (1980)
Adaptação do livro: O Iluminado (1977)
Autor: Stephen King
Stephen King odiou a adaptação de Stanley Kubrick de O Iluminado. No entanto, poderia ter sido um caso de pura birra, porque Kubrick rejeitou o roteiro que King escreveu para o filme, que era muito mais fiel ao livro. O filme inicialmente não teve um bom desempenho. No entanto, o tempo tem sido bom para O Iluminado, que é frequentemente citado como um dos melhores filmes de terror já feitos. Mesmo assim, King não conseguiu melhorar seu humor em relação ao filme com o tempo.
Em uma entrevista ele revelou: “o livro é quente e o filme, frio; o livro termina em fogo e o filme em gelo. No livro, há um arco real onde você vê Jack Torrance tentando ser bom e pouco a pouco o lugar vai transformando ele em um louco. E no que me diz respeito, quando vi o filme, Jack (Nicholson) estava louco desde a primeira cena. Eu tive que ficar de boca fechada na hora. Era uma exibição, e Nicholson estava lá. Mas estou pensando comigo mesmo no minuto em que ele está na tela: ‘Oh, eu conheço esse cara. Já o vi em cinco filmes de motos, onde Jack Nicholson fez o mesmo papel. E é tão misógino. Quero dizer, Wendy Torrance é apenas apresentada como esse tipo de pano de prato gritante. Mas isso sou eu, é assim que eu sou.”
Psicopata Americano (2000)
Adaptação do livro: Psicopata Americano (1991)
Autor: Bret Easton Ellis
Bret Easton Ellis não achava que adaptar sua história sobre um guru de Wall Street durante o dia e serial killer à noite fosse possível. Um de seus argumentos estava em parte enraizado na ambiguidade do livro – os leitores não sabem ao certo se Patrick Bateman é um assassino enlouquecido ou apenas totalmente delirante (embora se possa argumentar facilmente que a mesma ambiguidade existe no filme).
Ellis também não acha que o filme deveria ter sido feito por uma mulher (ele foi dirigido por Mary Harron), porque ele sente que o meio do filme “requer o olhar masculino”. Além disso, Ellis acredita que as mulheres não respondem aos filmes da mesma forma que os homens por causa de “como eles são construídos”. Já foram feitas algumas adaptações dos trabalhos de Ellis, e a única que ele revelou ter gostado foi Regras da Atração.
Em uma entrevista para o Oregon Live, ele disse:
Não sei se realmente funciona como um filme. É tentar pegar algo que não é passível de ser respondido e respondê-lo em um meio que exige respostas, que é o filme. Pela própria natureza do meio, ele exige que você faça escolhas. Onde um romance pode não ser resolvido, um narrador não confiável, não importa. Acho que Mary meio que estava tentando ter as duas coisas e meio que deixou com uma estranha sensação de deslocamento que não foi particularmente satisfatória. Algo que você pode se safar em um romance. Em um filme, especialmente um filme como esse, um filme bastante mainstream, é estranho.
A Fantástica Fábrica de Chocolate (1971)
Adaptação do livro: A Fantástica Fábrica de Chocolate (1964)
Autor: Roald Dahl
Roald Dahl não se importou particularmente com nenhuma das adaptações cinematográficas de seus livros, entre eles Matilda e James e o Pêssego Gigante. Seu maior problema com a adaptação de seu romance mais famoso, A Fantástica Fábrica de Chocolate, se deve ao fato de que seu livro se concentrava na história de Charlie, enquanto o filme dava muita atenção ao sinistro e ao mesmo tempo adorável Willy Wonka. Dahl também não gostou muito da direção de Mel Stuart ou da atuação de Gene Wilder – irônico considerando que para muitos espectadores Wilder é o destaque do filme. Ele queria o comediante Spike Milligan para o papel titular.
Liz Attenborough, administradora do Museu e Centro de Histórias Roald Dahl em Buckinghamshire, disse sobre o autor: “Ele achava que colocava muita ênfase em Willy Wonka e não o suficiente em Charlie. Para ele, o livro era sobre Charlie”.
Sahara (2005)
Adaptação do livro: Sahara (1992)
Autor: Clive Cussler
Há uma razão pela qual os romancistas não costumam se envolver na adaptação de seu próprio trabalho. Os filmes precisam cortar muitas partes de um romance, o que pode ser um processo doloroso para os autores. O produtor que financiou Sahara deu a Clive Cussler um tremendo controle criativo sobre tudo, desde o elenco até a aprovação do diretor e supervisão do roteiro (que acabou tendo dez autores).
No final, as coisas ficaram feias. Cussler ficou chateado por não ter a palavra final sobre o roteiro e falou mal do filme antes de estrear. Sahara, estrelado por Matthew McConaughey e Penélope Cruz, foi um desastre de bilheteria. Cussler processou a Crusader Entertainment por não lhe dar total autoridade sobre o roteiro, então a Crusader o processou por sabotar publicamente o filme.
Bonequinha de Luxo (1961)
Adaptação do livro: Bonequinha de Luxo (1958)
Autor: Truman Capote
Truman Capote se sentiu enganado quando Audrey Hepburn foi escalada como Holly Golightly já que ele queria Marilyn Monroe coma a protagonista. Ele também teve um problema com o elenco de George Peppard, simplesmente porque ele queria interpretar o protagonista masculino romântico, apesar de não ter experiência anterior em atuação.
No livro Capote: A Biography, de Gerald Clarke, foi citado um comentário do autor sobre a adaptação:
Marilyn teria sido absolutamente maravilhosa nele. Ela queria interpretá-lo também, na medida em que trabalhou duas cenas inteiras sozinha e as fez para mim. Ela era terrivelmente boa, mas a Paramount me traiu e escalou Audrey. Audrey é uma velha amiga e uma das minhas pessoas favoritas, mas ela estava errada para o papel.
A História Sem Fim (1984)
Adaptação do livro: A História Sem Fim (1979)
Autor: Michael Ende
O autor alemão Michael Ende escreveu o primeiro roteiro para a adaptação de seu romance de fantasia. Como a maioria dos roteiros de Hollywood, foi posteriormente reescrito por outro roteirista. Ende odiou tanto o novo roteiro que tentou, sem sucesso, comprar de volta os direitos do filme. Quando isso não funcionou, ele teve seu nome removido do projeto e o chamou de “filme revoltante”. O principal problema de Ende com a adaptação é que ele sentiu que o filme não entendia o livro e era simplesmente sobre fazer dinheiro.
A Rainha dos Condenados (2002)
Adaptação do livro: A Rainha dos Condenados (1988)
Autora: Anne Rice
Mais de um filme foi adaptado de As Crônicas Vampirescas, série de longa data mundialmente popular de Anne Rice. Ela gostou da primeira adaptação de seu trabalho, Entrevista com o Vampiro, estrelado por Tom Cruise como Lestat. No entanto, ela pensou que Hollywood “mutilou” A Rainha dos Condenados, uma história sobre Lestat (agora interpretado por Stuart Townsend) se tornando uma estrela do rock. Segundo a autora, a franquia não seguiu em frente por conta da falta de qualidade do filme, além dele não ter respeitado os fãs dos livros por ter simplesmente usado os nomes dos personagens, sem realmente se basear no enredo. O filme foi uma decepção crítica e de bilheteria.
Geração Prozac (2001)
Adaptação do livro: Geração Prozac (1994)
Autora: Elizabeth Wurtzel
A autobiografia de Elizabeth Wurtzel detalha suas experiências com a depressão enquanto estudava em Harvard. O livro de memórias destaca o abuso de drogas e álcool, a automutilação e a profunda melancolia pelos quais a autora passou durante o período. O título remete ao fato de que ela passou a tomar o antidepressivo Prozac após uma tentativa de suicídio.
Apesar de uma forte atuação de Christina Ricci como Wurtzel, o público de teste não se impressionou. Muitos sentiram que a protagonista parecia antipática e narcisista. Prozac Nation nunca recebeu um lançamento nos cinemas e a autora afirmou que chorou quando viu o filme pela primeira vez. Wurtzel achou que a narração de Ricci deveria ter vindo literalmente de seu livro.
Em uma entrevista ele disse:
Como você já deve ter percebido, é um filme horrível. É simplesmente horrível. Se eles achassem que era bom, eles teriam lançado há muito tempo. Você poderia argumentar que eu sou uma escritora terrível, mas eu sou a melhor versão de mim que existe.
Percy Jackson e o Ladrão de Raios (2010) e Percy Jackson e o Mar de Monstros (2013)
Adaptações dos livros: Percy Jackson e o Ladrão de Raios (2005) e Percy Jackson e o Mar de Monstros (2006)
Autor: Rick Riordan
Muitos fãs não ficaram satisfeitos com esses filmes, mas o mais insatisfeito com as adaptações da série de livros Percy Jackson e os Olimpianos certamente é o autor Rick Riordan. Ele nunca fez questão de esconder seu descontentamento e chegou a publicar em seu perfil no Twitter alguns comentários sobre suas frustrações em relação aos filmes.
Ainda não vi os filmes e não pretendo vê-los. Eu os julgo com base nos roteiros que li, porque eu me importo mais com a história. Eu certamente não tenho nada contra os atores muito talentosos. Não é culpa deles. Só lamento que tenham sido arrastados para essa bagunça.
Para a alegria de Riordan, seus livros serão adaptados para um série no Disney+ e eles está envolvido no projeto.