Hiroshi Okuyama, já reconhecido por seu trabalho singular em Jesus, entrega em Sol de Inverno uma obra que não apenas confirma sua habilidade como cineasta, mas também solidifica sua posição como um narrador sensível das nuances humanas. O longa, que circulou pelos principais festivais de cinema do mundo, traduz com delicadeza a transitoriedade da vida, como as estações que definem o ritmo da pequena ilha japonesa onde a trama se desenrola. Inspirado pela canção “Boku no Ohisama” da dupla Humbert Humbert, o filme consegue evocar uma profundidade emocional que remete aos trabalhos de Hirokazu Kore-eda (Monster, Assunto de Família), um mestre em retratar o cotidiano com uma poesia desarmante.
O cenário inicial é emblemático: uma ilha pacata onde a rotina dos moradores reflete a harmonia e a rigidez do ciclo das estações. É nesse espaço que somos apresentados a Takuya, interpretado com uma vulnerabilidade tocante por Keitatsu Koshiyama. Takuya não se encaixa nas expectativas da sociedade ao seu redor; enquanto seus colegas mergulham no competitivo hóquei no gelo, ele encontra sua paixão nos movimentos graciosos da patinação artística. A chegada de Arakawa (Sôsuke Ikematsu), um treinador que enxerga em Takuya um talento inexplorado, transforma não apenas a vida do jovem, mas também o microcosmo ao seu redor. Ao formar uma dupla com Sakura (Kiara Takanashi), estrela promissora do esporte, Takuya inicia uma jornada que mistura paixão, talento e a descoberta de quem ele realmente é.
A relação entre Takuya, Sakura e Arakawa é o coração pulsante do filme. Okuyama constrói com maestria a dinâmica entre esses personagens, destacando a fragilidade e a beleza das conexões humanas. A patinação, que começa como um refúgio para Takuya, logo se torna uma ponte que conecta os três personagens de maneira orgânica. Arakawa, por sua vez, emerge como uma figura paterna, mas também carrega o peso de seu passado e de suas escolhas, tornando-se um personagem tão fascinante quanto complexo.
Mas é Sakura quem dá ao filme um tom de tragédia moderna. Sua percepção de estar sendo deixada de lado, somada ao preconceito velado que observa ao descobrir a orientação sexual de Arakawa, cria uma espiral de conflitos internos que culmina em atos de dor e incompreensão. O roteiro não julga seus personagens; em vez disso, os apresenta como indivíduos imperfeitos, moldados por suas experiências e limitações. A homofobia que emerge na narrativa é tratada com uma sutileza que amplifica seu impacto, revelando não apenas o preconceito, mas também a covardia que frequentemente o acompanha.
O terceiro ato de Sol de Inverno é uma verdadeira aula de contenção emocional. Não há explosões dramáticas ou soluções fáceis, apenas o desdobramento natural de uma série de mal-entendidos que poderiam ter sido evitados com um simples diálogo. A metáfora da neve, que inicialmente une os personagens, mas inevitavelmente derrete, é profundamente simbólica. A transitoriedade do inverno espelha a efemeridade das conexões humanas e a necessidade de se valorizar os momentos antes que eles se dissipem.
Sol de Inverno é uma ode à complexidade das emoções, uma celebração da beleza dos pequenos gestos e um lembrete pungente de como nossas ações – ou a falta delas – podem moldar vidas. Um filme que não apenas merece ser visto, mas também sentido em sua plenitude.
Com distruição da Michiko Filmes, Sol de Inverno estreia no dia 16 de janeiro nos cinemas.
BOM
Sol de Inverno é uma ode à complexidade das emoções, uma celebração da beleza dos pequenos gestos e um lembrete pungente de como nossas ações – ou a falta delas – podem moldar vidas. Um filme que não apenas merece ser visto, mas também sentido em sua plenitude.