Lady Gaga no Rio: Um espetáculo de redenção e apoteose à beira-mar Lady Gaga no Rio: Um espetáculo de redenção e apoteose à beira-mar

Lady Gaga no Rio: Um espetáculo de redenção e apoteose à beira-mar

Ela voltou melhor, mais potente, mais humana. Mais Gaga.
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Foram exatos 13 anos de espera. Treze anos de promessas, memes, especulações, teorias de fãs, e uma ferida aberta desde o fatídico cancelamento no Rock in Rio de 2017. Mas nesta noite de sábado, a cidade do Rio de Janeiro finalmente curou essa ausência com uma catarse coletiva à beira do mar. Lady Gaga, a camaleoa do pop, a performer maximalista, a artista que se recusa a ser previsível, subiu ao colossal palco montado na Praia de Copacabana para a segunda edição do Todo Mundo no Rio, iniciativa da prefeitura que mais uma vez provou que arte e cultura são instrumentos de união social em uma das cidades mais apaixonadas do mundo. Depois de Madonna, agora foi a vez de Gaga — e o que se viu foi um espetáculo para 2,1 milhões de pessoas, segundo a Riotur, que não apenas marcou a volta da cantora ao Brasil, mas reescreveu as regras do que entendemos por um show ao ar livre.

Com a turnê do disco Mayhem — seu mais recente álbum com aclamação de público e crítica —, Gaga trouxe não apenas sua música, mas um verdadeiro estado de espírito. E mais do que isso: trouxe sua enorme estrutura de palco, figurinos que remetem ao gótico, dançarinos bem perfomáticos, e uma iluminação que transformava a areia de Copacabana em algo entre um templo e uma pista de dança. O gostinho já havia sido dado em Coachella, onde a artista usou esse set, mas o que se viu nesta noite foi uma versão elevada à enésima potência. Desde os primeiros acordes de “Abracadabra” (já candidata a hino absoluto dessa nova fase), passando pelo frenesi de “Judas” e a explosão nostálgica de “Poker Face”, cada passo era acompanhado por gritos ensurdecedores e lágrimas de quem esperou mais de uma década por esse momento.

 

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O espetáculo foi construído com uma precisão quase ritualística. Cada troca de figurino — uma delas com as cores verde e amarelo vibrando como neon sob os holofotes — parecia pensada para dialogar com o coração do público brasileiro. Um de seus discuros foi traduzido simultaneamente, mas bastava olhar para Gaga e sua entrega física e emocional para entender o que ela dizia: ela estava ali por inteiro. Houve dança, houve teatralidade, houve até espaço para o improviso. Em um dos momentos mais tocantes, a cantora se ajoelhou ao centro do palco e, em lágrimas, ergueu os braços para o céu, recebendo de volta uma ovação que parecia não ter fim. A simbologia era clara: este não era só um show, era um ritual de cura, de celebração, de reencontro.

“Brasil, eu estou pronta!”, declarou Gaga com voz embargada, enquanto a plateia explodia em uma mistura de choro e êxtase. “Eu amava vocês dez anos atrás e eu amo vocês esta noite. Obrigada, Brasil. Eu amo vocês para sempre”, disse, em um dos momentos mais emocionantes da noite — uma verdadeira epifania pop. Era impossível não lembrar do cancelamento de sua apresentação no Rock in Rio em 2017, por motivos de saúde, e entender essas palavras como uma espécie de retratação, mas também de reconexão. Gaga não só voltou. Ela voltou melhor, mais potente, mais humana. Mais Gaga.

Mas um gesto, simples e contínuo, dizia mais do que todas as luzes e efeitos especiais: Lady Gaga jamais disse “Rio!” entre uma canção e outra. Era sempre “Brasil!”. Ela sabia onde estava. Sabia para quem estava cantando. Com os olhos marejados diante das câmeras e acenos quase íntimos, Gaga falava com o país inteiro, não só com quem teve a sorte de estar fisicamente na praia. A escolha de palavras, o cuidado nos gestos e o carinho explícito pelo povo brasileiro foram as provas definitivas de que aquela mulher ali não performava. Ela se doava.

A sequência final do show foi como se o tempo tivesse parado em Copacabana. Ao som de “Shallow”, a multidão transformou-se num só coral — vozes se entrelaçando com a da cantora em um dos momentos mais épicos da história musical recente da cidade. E então veio “Bad Romance”, com seus sintetizadores ensurdecedores e coreografia precisa, selando a noite com um encerramento digno das maiores celebrações. Havia dança, havia suor, havia poesia. A praia virou templo, o palco virou altar, e Gaga, uma sacerdotisa que guiava a todos por um transe coletivo.

Mais do que um concerto, o que se viu foi um evento histórico. Não apenas a maior apresentação da carreira de Lady Gaga, mas, sem dúvida, o maior espetáculo já realizado na cidade do Rio de Janeiro. Uma noite que extrapolou as barreiras da música e se tornou um marco cultural. Um tributo à arte em sua forma mais ampla, à diversidade como força motriz, e à cultura como elo entre artista e multidão. O Rio, mais uma vez, reafirma sua vocação para o extraordinário — e Lady Gaga, enfim, eterniza-se entre as divas que conquistaram o coração do Brasil com coragem, sensibilidade e pura genialidade.