Crítica | Ben-Hur traz mensagem de bondade em tempos de guerra

Em 1959 foi lançado o filme Ben-Hur, produzido pela MGM e dirigido por William Wyler. A obra era grandiosa em sua escala técnica (cenários, figurinos, figuração e efeitos práticos), até mesmo em sua longa duração de 222 minutos. Pode-se dizer que o filme é intocável, como o próprio Jack Huston (Judah Ben-Hur) nos contou em sua vinda ao Brasil, complementando que a releitura feita pelo diretor Timur Bekmambetov não tem o intuito de substituí-la, mas de trazê-la para a linguagem contemporânea com uma mensagem indubitavelmente importante para o nosso cotidiano.

Para quem não conhece o romance escrito por Lew Wallace, Ben-Hur: Um Conto do Cristo, de 1880, conta a história do nobre Judah Ben Hur (Jack Huston), contemporâneo de Jesus Cristo (Rodrigo Santoro), que é injustamente acusado de traição e condenado à escravidão. Ele sobrevive ao tempo de servidão e descobre que foi enganado por seu próprio irmão, Messala (Toby Kebbell), partindo, então, em busca de vingança. O conto de Wallace é retratado da mesma premissa no filme produzido por Timur, sofrendo algumas sutis alterações para ser, na visão do diretor, uma obra contemporânea.

O filme inicia mostrando a relação forte de amizade entre os irmãos Judah e Messala,  comprovando o que um poderia fazer para ajudar o outro, não importando o que isso custe a cada um. Posto de lado essa relação, também são mostradas as inúmeras diferenças entre eles, começando pelo fato de Messala ser um romano morando numa casa judia em Jerusalém. Nossos Deuses são diferentes, Messala, diz Naomi Ben-Hur (Ayelet Zurer), para praticamente cravar que dentro daquele lar, Messala ainda era um forasteiro. Com esse sentimento, o romano posterga a casa dos Hur em busca de glória e reconhecimento, alistando-se no exército romano para que todos conhecessem seu nome.

Messala traça sua jornada adentrando ao exército, fazendo o seu advento em uma das inúmeras batalhas que expandiam o Império Romano. O filme peca tecnicamente nesse momento da trama, mostrando o jovem romano travar suas batalhas numa filmagem que parece ter sido realizada com câmera de mão – só que muito mais tremida. Tudo que ocorre nessas sequências de ação é extremamente confuso e bagunçando, forçando o público a cerrar os olhos pra poder entender a ação por detrás do personagem, tanto quanto o que acontecia com ele durante a progressão da cena. Não é um momento isolado onde a filmagem peca, porque há instantes onde os personagens dialogam e parte de seus semblantes é cortado de cena, além do posicionamento inclinado da câmera em alguns momentos, restando a dúvida se era um estilo proposital, se foi um desleixo ou uma limitação dentro do orçamento de US$ 100 milhões.

A filmagem e a fotografia podem incomodar em alguns pontos, mas em outros alia-se a sua grandiosidade e traz momentos memoráveis, que compensam os erros. Um deles – e o mais importante -, é a disputa entre os irmãos e outros competidores na corrida de bigas, onde os próprios atores afirmaram que boa parte da produção foi real e eles tiveram que aprender a controlar os cavalos durante meses antes de realizarem a enorme sequência de ação, que também é o clímax do filme. Eu não sei se vou conseguir fazer isso, Jack Huston contou o que Toby lhe dissera sobre a cena, e também o que respondeu Nem eu. Todo treinamento feito e todo trabalho realizado foi compensado por uma memorável sequência, arquitetada de forma magistral pelo diretor.

Posterior às batalhas sangrentas de Messala, Judah Ben-Hur vive sua vida tranquilamente em Jerusalém com sua mulher, Esther (Nazanin Boniadi). E são nesses momentos de calma durante a trama que somos apresentados a Jesus, encarnado pelo ator brasileiro Rodrigo Santoro em uma das melhores performances de sua carreira. A ideia era trazer Jesus para o cotidiano, como um simples artesão ou qualquer homem que andasse nas ruas naquela época,  Santoro nos contou; e essa ideia funciona. Diferentemente dos filmes onde temos a figura bíblica de Jesus como protagonista. Nessa história ele é somente um mero coadjuvante, que tem pouco tempo de tela, mas nos momentos em que aparece, consegue mudar todo desenrolar da história e também nos ensinar algo novo. Na época em que foi escrito o romance, Lew Wallace era um ateu com a tentativa de comprovar que Jesus não era filho de Deus, mas acabou sendo convertido no processo de suas pesquisas – e podemos ver essa sutil mensagem dentro do filme, tratando-se não de uma história de Deus, mas de redenção.

A transição do enredo da Ben-Hur do momento em que ele era um nobre judeu em Jerusalém até o momento em que se torna um pobre escravo, tendo sua família igualmente condenada e perdida é bem desenvolvida, assim como as relações entre cada personagem (desde os interesses amorosos do protagonista e antagonista, como também a relação familiar entre os Hur). As atuações são todas pontuais e não devem em nada, sendo os destaques por parte de: Jack Huston, Toby Kebbell, Rodrigo Santoro e Nazanin Boniadi. Também há um papel interpretado por Morgan Freeman, como Sheik Ilderim, que tem a missão de treinar e ajudar Judah com sua vingança, mas pelos seus próprios motivos.

Ben-Hur não é o filme que substituirá o clássico de 1959, tanto que sua intenção não é essa. Ele traz, para todos que o assistirem, uma mensagem extremamente forte, emocional e até atemporal, que é contada de forma exímia desde seu início e revelada no final de uma forma arrebatadora. O brilhantismo de Ben-Hur também está na inclusão: não importa se você é ateu, agnóstico, judeu, cristão, espírita ou qualquer tipo de segmentação religiosa, a mensagem consegue englobar toda e qualquer pessoa que vive no mundo de hoje. Essa forma de inclusão encaixa perfeitamente quando percebemos que Messala sofria preconceito por ser de uma origem discrepante a judia, assim como é perceptível o preconceito e ignorância com as doenças daquela época e, consequentemente, a reclusão social que essas mesmas pessoas eram impostas. Hoje, podemos pegar esses inúmeros exemplos de preconceitos e aplicá-los ao nosso cotidiano, para as diferenças e peculiaridades de cada um, mostrando que ninguém é diferente de ninguém; vivemos abaixo do mesmo céu e sob a mesma terra – e para perceber isso não é necessário ter alguma crença. A mensagem de bondade é tão forte que sobressai e torna-se mais importante que qualquer termo técnico, por isso o filme cumpre o seu papel trazendo reflexão e motivação a todos que o assistam para serem mais benevolentes, aprendam a perdoar e o principal: a viver com o próximo.

  • Bom
3

Resumo

Ben-Hur não é o filme que substituirá o clássico de 1959, tanto que sua intenção não é essa. Ele traz, para todos que o assistirem, uma mensagem extremamente forte, emocional e até atemporal, que é contada de forma exímia desde seu início e revelada no final de uma forma arrebatadora. A mensagem de bondade é tão forte que sobressai e torna-se mais importante que qualquer termo técnico, por isso o filme cumpre o seu papel trazendo reflexão e motivação a todos que o assistirem.

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