É inegável que a editora Pipoca & Nanquim se consolidou, nos últimos anos, como uma verdadeira curadora do terror gráfico no Brasil, tendo sido a responsável por trazer aos leitores nacionais a totalidade da obra de Junji Ito, um dos nomes mais emblemáticos do horror contemporâneo. Agora, mantendo essa vocação, a editora lança PTSD Radio: Frequências do Terror Vol. 1, de Masaaki Nakayama, um autor que, embora menos conhecido do grande público ocidental até então, não deve absolutamente nada aos mestres que o antecederam. Pelo contrário: Nakayama se coloca à altura de nomes como Junji Ito, Kazuo Umezz, Suehiro Maruo e Shintaro Kago, não apenas em termos técnicos, mas sobretudo na maneira visceral como concebe o horror — um horror que não apenas espreita, mas que invade, contamina e reverbera.
PTSD Radio é, acima de tudo, um compilado de histórias que se recusam a ser simplesmente lidas e abandonadas. A obra parece operar por uma lógica própria, como se, a cada página virada, o leitor fosse enredado numa frequência invisível, numa espécie de onda fantasmagórica que se propaga para além do papel. E isso não é mero artifício estilístico: a narrativa de Nakayama tem uma cadência hipnótica, construída por quadros que alternam com maestria entre o grotesco explícito e o sugestivo perturbador, evocando diretamente as atmosferas malsãs que caracterizam os mestres do ero guro, mas também transcendendo esses limites, ao trabalhar o terror não só como espetáculo, mas como experiência sensorial e até metafísica.
Não é à toa que a trajetória de produção de PTSD Radio se tornou, por si só, uma lenda urbana. Indicado ao Prêmio Eisner de Melhor Edição Norte-Americana de Material Asiático em 2023, o mangá carrega consigo um histórico de bastidores tão assombroso quanto suas próprias páginas. Há relatos persistentes de que, após desenhar essas histórias, Nakayama passou a vivenciar fenômenos inexplicáveis: sombras que se moviam sozinhas, vozes sussurrantes em um estúdio alugado, e, num episódio que beira o macabro, uma rara doença hemorrágica que quase o levou à morte. Esses eventos, que se tornaram parte do folclore envolvendo a obra, reforçam a aura maldita que PTSD Radio carrega — como se o horror ali condensado tivesse rompido a barreira da ficção para se manifestar na vida real. Um raro e perturbador exemplo de arte que não apenas imita a vida, mas a transforma, para o bem ou para o mal.
Formalmente, Nakayama opta por uma estrutura narrativa profundamente fragmentada, compondo a obra como um mosaico de vinhetas que se interligam tenuemente, mas que jamais se entregam de forma linear. Cada segmento é identificado por uma frequência específica de rádio — uma metáfora poderosa que articula não apenas o título, mas também o conceito central da série: a ideia de que traumas e horrores reverberam no tempo e no espaço, como ondas invisíveis que captamos de maneira inconsciente. Esse artifício cria uma leitura labiríntica, que exige do leitor atenção redobrada e, ao mesmo tempo, o impulsiona adiante, pois, como um bom thriller, cada cena é construída com ganchos irresistíveis que tornam praticamente impossível interromper a leitura.
E aqui reside uma das maiores forças da obra: a sua habilidade de criar tensão não a partir de grandes reviravoltas, mas através de pequenas perturbações, detalhes aparentemente banais que, aos poucos, vão compondo um quadro de desconforto insuportável. Nakayama sabe, como poucos, que o horror mais eficaz é aquele que insinua, que se aloja silenciosamente nas frestas da percepção até se tornar impossível de ignorar. Assim, PTSD Radio não apenas assusta, mas deixa marcas — uma experiência que não se encerra ao fechar o volume, mas que permanece reverberando na mente e nos sentidos.
É impressionante notar como a arte de Nakayama potencializa essa proposta: seus traços são marcadamente realistas, com uma precisão quase fotográfica, mas que não se exime de distorções brutais quando o horror emerge em sua plenitude. Os enquadramentos são meticulosamente calculados para maximizar a sensação de claustrofobia e estranhamento, enquanto o uso do preto e branco — com uma profusão de sombras opressoras — contribui para a atmosfera densa e sufocante que permeia toda a obra. Não há concessões ao alívio: cada página é um convite ao abismo.
O primeiro volume se encerra deixando o leitor não apenas impactado, mas ansioso pela continuidade. Como já anunciado, mais dois volumes compõem a série, sendo que o segundo já se encontra em pré-venda pela Pipoca & Nanquim — um presente para os aficionados por mangás de terror e uma prova de que o Brasil, cada vez mais, se insere com protagonismo no circuito mundial de publicações de horror gráfico.
Não posso deixar de sublinhar o simbolismo que permeia este lançamento: trata-se de uma obra que não apenas consolida Masaaki Nakayama como um dos grandes nomes do terror contemporâneo, mas que também reforça o papel das editoras brasileiras na curadoria e promoção de quadrinhos que, de outra forma, permaneceriam restritos a nichos muito específicos. É um momento importante para o mercado editorial e, sobretudo, para os leitores que buscam experiências intensas, desconcertantes e profundamente transformadoras.
PTSD Radio: Frequências do Terror Vol. 1 é um mangá que desafia os limites entre ficção e realidade, entre o medo e o fascínio, entre a sanidade e o abismo. Uma leitura indispensável para quem deseja explorar não apenas o gênero, mas os meandros mais sombrios da experiência humana. E, talvez, um aviso silencioso: cuidado com as frequências que você sintoniza. Algumas delas podem nunca mais te deixar em paz.
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