Psicose (1960) | O filme que definiu um gênero

O diretor Alfred Hitchcock certa vez afirmou que seu objetivo como cineasta era fazer o espectador sofrer. Certamente, todos os seus filmes são carregados por essa marca e intensificam nos espectadores um sentimento de angústia, aquela impressão de não saber exatamente o que está acontecendo. Pistas vão sendo colocadas ao longo da história até se juntarem no final em uma agoniante sensação de que não há muito o que fazer se não fugir ou se esconder.

Psicose é uma adaptação de um livro homônimo, escrito por Robert Bloch (escritor americano de histórias de terror), e tem como inspiração um caso real ocorrido nos Estados Unidos na década de 1950. Conta-se que o diretor teria adquirido os direitos da história e comprado todos os exemplares do livro, para que ninguém soubesse o final de antemão. Rodado inteiramente em preto e branco (por opção de Hitchcock, já que as produções coloridas já eram bem presentes em Hollywood) e com um orçamento baixo, o filme foi um sucesso estrondoso, sendo indicado a 4 Oscars e conquistando um Globo de Ouro de Melhor Atriz Coadjuvante.

ATENÇÃO! Contém spoilers!

Na história, a secretária Marion Crane (interpretada por Janet Leigh) rouba 40 mil dólares de seu patrão e foge para encontrar o namorado, Sam Loomis (John Gavin). Dirigindo por uma estrada, ela acaba perdida em meio a uma forte chuva que caía, e então decide se hospedar no isolado Motel Bates, gerenciado por um homem misterioso, Norman Bates (Anthony Perkins), que vive à sombra da mãe superprotetora, Norma. Quando conhecemos Norman, a impressão é de que se trata de um homem frágil e atrapalhado, pouco preparado para gerir o motel da família, que por acaso anda bem mal por conta do isolamento, depois que um desvio na estrada diminuiu o movimento de carros por ali. Motel isolado, uma moça em fuga, um homem que não tem muitos amigos e passa o tempo empalhando animais, cenário perfeito para um crime…

É aí que entra uma das grandes inovações do enredo, principalmente para a época. A personagem principal, aquela que acompanhamos desde o primeiro minuto, acaba sendo assassinada a facadas na metade da história, em uma cena violenta e que ficou marcada para sempre como sinônimo de horror e crueldade. Uma figura sem rosto, a quem o espectador julga ser a mãe de Norman, invade o banheiro e esfaqueia a pobre moça, que nada pode fazer para se defender. O espectador talvez nem se dê conta, dada a tensão da cena (orquestrada por uma atordoante sinfonia de violinos), que a faca nunca penetra no corpo da mulher, e que toda a ação se desenrola em pouco mais de 30 segundos. Até hoje, mesmo quem nunca viu o filme fica tenso ao ver alguém entrar no chuveiro, um recurso recorrentemente utilizado no cinema para promover suspense.

Outras tramas passam a imperar então. A história se concentra na busca por Marion, depois que a irmã Lila (Vera Miles) se dá conta do sumiço dela. Em outra frente, Norman faz de tudo para esconder as evidências do crime, principalmente quando um detetive particular, Arbogast (Martim Balsam), contratado por Lila, chega ao motel para investigar. O detetive também acaba sendo morto pela mesma figura sem rosto e Lila e Sam Loomis, o namorado que não a encontrou depois que ela fugiu, concluem a investigação por conta própria: Marion fora assassinada pelo próprio Norman, que mantinha o cadáver da mãe em um cômodo da casa, usando uma peruca e as roupas dela para matar.

No fim, ocorre a segunda cena mais memorável do filme: a câmera vai se fechando num close no rosto de Norman, enquanto a voz da mãe declara tudo o que houve. Só aí o espectador descobre que Norman sofria de um distúrbio de dupla personalidade, porque havia matado a mãe e resgatado seu corpo do cemitério, passando a cuidar dela como se estivesse viva e recriando-a em sua cabeça, ou seja, um personagem extremamente complexo se escondia por trás daquele rapaz inocente. O olhar de Norman para o espectador nessa cena é um misto de inocência e maldade, quase hipnótico, fixando em nós uma certeza de que o horror estava longe de acabar ali, enquanto seu rosto se transforma por um flash de segundo no cadáver de sua mãe.

Assim como o livro que o inspirou, o longa teve continuações, estreladas por Perkins ou com a participação dele, mas não tão expressivas como sua obra-mestra. Houve também uma adaptação de 1998, reproduzida quadro a quadro, mas em cor, do diretor Gus Van Sant (Gênio indomável) e com Vince Vaughn no papel do psicopata, além, é claro, da série iniciada em 2013, Bates Motel, que conta as origens do assassino. Algumas outras referências podem ser vistas em filmes como Halloween (o Doutor Sam Loomis, que cuida do caso de Michael Myers), Pânico (o sobrenome do primeiro assassino é Loomis), além de diversas referências às duas cenas icônicas que tratamos aqui (depois de Psicose, sempre que vir um assassino olhando fixamente para a câmera, você vai se lembrar de Norman Bates). Talvez as novas gerações não considerem o filme assustador, mas sem dúvidas ele está marcado na história do cinema como uma produção que revolucionou e inventou um conceito de medo e tensão.

Vale a pena ver!