As crianças do final da década de 1980 e da década de 1990 tinham o mesmo ritual, que consistia em esperar pelo horário de seu desenho animado favorito em algum dos poucos canais da TV aberta. Um dos desenhos mais queridos da época era Caverna do Dragão, que mostrava a aventura de jovens presos em um mundo repleto de magia e dragões, mas que até então não havia ganhado um episódio final. Em O Último Episódio, de Maurilio Martins, Erik (Matheus Sampaio) é um garoto de 13 anos que sempre assiste ao querido desenho acompanhado por seus melhores amigos Cassinho (Daniel Victor), que não tinha TV em casa por motivos religiosos, e Cristão (Tatiane Costa), uma garota apaixonada pela música Doce Mel.
Erik se apaixona por Sheila (Lara Silva), a garota nova da escola. Na tentativa de impressioná-la, ele diz possuir a fita de videocassete com o último episódio de Caverna do Dragão, que um primo trouxe dos Estados Unidos. Por conta dessa mentira, ele embarca em uma jornada para criar esse episódio. Para isso, Erik conta com a ajuda de seus amigos e com a antiga câmera filmadora de seu pai, que faleceu anos antes e deixou esse único objeto de valor como herança para o garoto. Durante esse processo, vamos acompanhando essas pessoas saindo da infância e entrando na adolescência enquanto lidam com várias questões pessoais.
O filme é inspirado nas memórias da infância do diretor Maurilio Martins no bairro do Laguna, em Contagem, Minas Gerais – inclusive, é uma delícia poder ouvir o sotaque mineiro na telona, já que não são muitos os lançamentos gravados nesse Estado. É notável como O Último Episódio é um filme feito com muito carinho e com lembranças muito precisas daquela época. Os millennials vão se deliciar com as memórias que vão desde as músicas usadas na trilha sonora até a camiseta começando a ficar pequena – com aquela cara de roupa de criança que cresceu – que o protagonista usa do chiclete Ping Pong enquanto come um chocolate Surpresa. A fotografia, os figurinos e a estética geral do filme nos fazem mergulhar nesse período da história de maneira muito convincente – inclusive o elenco é formado por pessoas que definitivamente não “tem cara de sabe o que é um iPhone”.
Filmes sobre amadurecimento sempre encontram uma grande conexão com o público, pois crescer é uma experiência universal, mas esse tem um gostinho brasileiro que é especial. Muito focado nas amizades, o título não faz referência somente ao episódio final do desenho animado, mas também ao fim da infância – esse é o último episódio desses amigos antes de entrarem de vez na adolescência. Erik está começando a se interessar por meninas, querendo finalmente experienciar o primeiro beijo, enquanto tenta manter uma boa relação com a mãe, que se esforça muito para dar uma boa vida ao garoto, mas ao mesmo tempo é ausente por trabalhar demais. Cassinho luta para ter sua própria identidade, que é reprimida pela mãe extremamente religiosa. E Cristiane, a Cristão, lida com a ausência da mãe, que foi morar nos Estados Unidos e mal liga para saber da filha.
Com aquele jeitinho gostoso de filme da Sessão da Tarde, O Último Episódio é um filme sobre amadurecimento que retrata uma das últimas gerações com a infância completamente analógica com muito carinho. Apesar de trazer temas mais densos como depressão, morte e abandono, o que impera é a nostalgia. Vale a pena acompanhar Erick, Cassinho e Cristão nessa jornada.
O Último Episódio chega aos cinemas no dia 9 de outubro e é uma codistribuição da Malute e Embaúba Filmes. A produção do longa é da Filmes de Plástico.
Bom
Com ares de Sessão da Tarde, O Último Episódio se utiliza de um dos desenhos mais famosos do ano de 1991 para mostrar as dores, os medos e as vergonhas que a passagem da infância para adolescência pode trazer, tudo isso com muito bom humor, carinho e nostalgia.