O Sobrevivente (2025)
Divulgação.
O Sobrevivente (2025)
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O Sobrevivente corre para uma direção divertida, mas desacelera ao não saber dosar diversão e crítica social

Se discute muito a necessidade de remakes de filmes dos anos 1980-90. Para muitos, esse movimento é puramente comercial, já que algumas obras originais — mesmo datadas — ainda conversam perfeitamente com os dias de hoje. Um exemplo claro é O Sobrevivente (1987), inspirado no livro homônimo de Stephen Kingassinado sob o pseudônimo Richard Bachman — e estrelado por Arnold Schwarzenegger. Apesar das limitações técnicas e das cenas “galhofas”, o filme é considerado à frente de seu tempo, especialmente por tratar de manipulação midiática, distopia solitária e violência como entretenimento social. Então, valeria um remake? Sim — ainda mais se dirigido pelo brilhante Edgar Wright.

A trama se passa em um futuro distópico governado pela indiferença social e por grandes corporações. Os pobres vivem da falsa promessa de ascensão, enquanto os ricos se divertem com o sofrimento dos menos afortunados. Nesse cenário acompanhamos Ben Richards (Glen Powell), um pai desesperado por dinheiro para salvar a filha e garantir uma vida melhor à sua família. Sem perspectivas, ele decide entrar no programa televisivo de maior audiência, O Sobrevivente, onde, durante 30 dias, será caçado por todos — inclusive assassinos profissionais. Caso sobreviva, leva para casa US$ 1 bilhão. Mas Ben logo percebe que o show fascista fará de tudo para manipulá-lo, dificultar seu caminho e testar seus limites até o fim.

Wright tenta equilibrar o clima sombrio criado por Stephen King com a ação exagerada do filme de 1987. O resultado é um longa divertido, com lampejos de crítica social que, embora interessantes, não são desenvolvidos como poderiam.

Os maiores acertos estão no elenco. Glen Powell se consolida como um dos grandes nomes da ação contemporânea, entregando carisma e humanidade a um personagem movido por propósito e raiva contra o sistema. Colman Domingo brilha como Bobby Thompson, o apresentador sádico; e Josh Brolin entrega força e frieza como Dan Killian, o implacável produtor do programa.

A expectativa, porém, pesa. O filme está longe de ser ruim, mas, com Edgar Wright na direção, era impossível não esperar algo mais elegante e ousado. Em algumas cenas, sua assinatura aparece — especialmente nas perseguições —, mas, no conjunto, este talvez seja seu projeto menos autoral.

O design de produção, por outro lado, é um show à parte: recheado de referências divertidas e críticas sociais afiadas que dialogam diretamente com o presente. Wright não poupa críticas ao fascismo corporativo e à manipulação midiática dos EUA.

Entre adaptar o livro de King, homenagear o filme de 1987 e criar sua própria versão, Wright parece ter aberto mão de parte da sua identidade. O ritmo, que sempre foi sua marca registrada, aqui oscila, e em alguns momentos surge a sensação de cansaço, como se a história estivesse correndo mais do que precisava. Q

Mesmo assim, o filme compensa com cenas de ação bem divertidas e uma comédia ácida muito bem encaixada, usando a personalidade bruta de Ben Richards para gerar situações inusitadas em uma sociedade fria e distante. Vale citar também a ótima participação de Michael Cera, que, mesmo com pouco tempo em cena, consegue arrancar risadas com mínimos gestos.

Mesmo tropeçando, O Sobrevivente (2025) entretém com seu universo cyberpunk/retrofuturista e coloca Glen Powell em um papel que combina perfeitamente com ele. Edgar Wright justifica o remake ao revisitar a discussão sobre a natureza volúvel da verdade na mídia, o individualismo americano e o espírito das revoluções — ainda que acelere mais do que deveria em certos momentos.

3.5

Bom

Edgar Wright adapta o universo criado por Stephen King com energia e estilo, mas deixa de lado parte da sua assinatura autoral para entregar algo mais “seguro”.

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