Crítica | Doutor Estranho introduz multiverso em história introspectiva

A Marvel Studios deu um passo à frente ao introduzir um novo conceito para o seu universo cinematográfico. Doutor Estranho traz novos ares para a fórmula, focando em introduzir o multiverso e, claro, a ascensão de Stephen Strange para se tornar o Mago Supremo. O filme traz um pouco do que conhecemos quando trata-se de origem de heróis, mas ele também consegue ser diferente de tudo que vimos no tema. Scott Derrickson apresenta uma história introspectiva, oposta de que qualquer outra já feita pela Marvel, junto do visual psicodélico de fazer queixos caírem e prédios se dobrarem ao meio.

Stephen Strange, interpretado (ou retirado das páginas de quadrinhos) por Benedict Cumberbatch, é um neurocirurgião arrogante e egocêntrico, que prefere escolher seus casos operatórios à atender qualquer pessoa que pudesse manchar seu histórico de sucesso. E é com essa soberba, enfatizada com seus trejeitos e por toda ambientação de seu apartamento – os inúmeros relógios, o smoking sob medida e o próprio carro esportivo -, que Stephen terá sua inesperada queda e dilema. A caminho de uma palestra comemorativa, o doutor perde o controle do veículo e sai da pista, sofrendo um grave acidente em uma das cenas mais viscerais da Marvel. A partir deste ponto, vemos o ego de Strange buscar todo e qualquer tipo de tratamento para recuperar o movimento de suas mãos e, consequentemente, sua carreira e reputação. Quando todas as alternativas se esgotam, e até mesmo o seu dinheiro, Stephen recorre ao Kamar-Taj, utilizando o que restava de sua enorme renda para viajar até o local e tentar reaver os movimentos de suas mãos.

A Anciã (Tilda Swinton, que está impecável) e Barão Mordo (Chiwetel Ejiofor), tem o papel de revelar a Stephen Strange o quanto ele não conhece do universo em que vive. E nós, espectadores, entramos na mesma viagem do protagonista, já que somos apresentados pela primeira vez ao multiverso e o misticismo envolvido nas histórias do Doutor Estranho. É nesse ponto que Derrickson faz seu filme brilhar, jogando sem medo algum cores vibrantes, viagens astrais, mãos saindo de mãos em um eterno loop (exemplificando a obsessão de Strange pela sua cura), além da própria dimensão negra e resquícios da presença de Dormammu. Doutor Estranho não tem vergonha de ser um filme baseado em quadrinhos, tanto que ele faz questão que saibamos ao decorrer de sua história, visual e humor ácido, que são transpostos fielmente das páginas de Steve Dikto e Stan Lee.

Durante as gravações de Doutor Estranho, principalmente no início, vazaram algumas fotos na internet das filmagens realizadas nas ruas de Nova Iorque, com Benedict Cumberbatch,  Chiwetel Ejiofor e Mads Mikkelsen pulando diversas vezes no meio da rua e rendendo memes nas redes sociais. No entanto, a cena finalizada trata-se de uma mistura de A Origem (Christopher Nolan, 2010) e Matrix (Irmãos Wachowski, 1999), com toda cidade de Nova Iorque dobrando-se centenas de vezes ao meio, portais se abrindo, diversas variações mágicas sendo realizadas: escudos, chicotes, lanças, alteração da realidade (a que realmente existe e a espelhada, que não interfere no mundo real), mudar forma de objetos e artefatos que escolhem seu mago, como o próprio manto de Stephen. Doutor Estranho é um baile visual e fotográfico, além de esbanjar belas atuações de seu estrelado elenco.

O talento de Benedict Cumberbatch é inegável, mesmo para as pessoas que irão conhecê-lo pela primeira vez nesse filme. A transição da arrogância e do egocentrismo, passando pelos delírios e obsessões até a figura sábia e altruísta do Mago Supremo é indiscutível, e talvez seja por isso que Derrickson tenha apostado muito em uma história focada nessa transição do que no desenvolvimento de vilões e grandes ameaças. Kaecilius (Mads Mikkelsen) traz o papel de antagonismo no filme, mas sua participação é exclusivamente feita para apresentar com mais detalhes a Dimensão Negra e o domínio de Dormammu, assim como sua cobiça de conquistar a Terra. Nessa questão, Doutor Estranho pode agradar uns e desagradar outros pela falta de vilões marcantes como Loki e até o discutível Ultron. Por outro lado, há o ponto positivo de todos os eventos da trama escrita por Jon Spaihts e Robert Cargill focarem exclusivamente na evolução de Stephen, assim como na própria resolução do terceiro ato ser consequência direta dessa evolução. O problema, enfim, pode ficar na indecisão de que história contar, faltando um pouco de ambição no roteiro – algo que sobrou no visual e nas sequências de ação.

Doutor Estranho é uma aposta bem sucedida, trazendo um novo universo e um começo para os filmes místicos do estúdio, além das diversas – e sutis – referências dentro do contexto do Universo Cinematográfico, seja um plano aberto de Nova Iorque com o QG dos Vingadores, citações de seus feitos no mundo físico e até mesmo a introdução de outra Joia do Infinito, presente no Olho de Agamotto. Fica muito claro qual será a participação de Strange e o que está resguardado para seus próximos filmes, afinal, Doutor Estranho não só será um novo começo para o estúdio, como também será o personagem mais importante das novas fases e será decisivo no tom delas.

Observação: o filme possui duas cenas pós-créditos que fazem conexões importantes com as Fases 3 e 4, portanto, permaneça no seu lugar e aguarde pelas surpresas.

  • Bom
3

Resumo

Doutor Estranho traz novos ares para a Fórmula Marvel, focando em introduzir o multiverso e, claro, a ascensão de Stephen Strange para se tornar o Mago Supremo. Scott Derrickson apresenta uma história introspectiva, oposta de que qualquer outra já feita pela Marvel, junto do visual psicodélico de fazer queixos caírem e prédios se dobrarem ao meio. Doutor Estranho não só será um novo começo para o estúdio, como também será o personagem mais importante das novas fases e será decisivo no tom delas.