Crítica | Cinquenta Tons de Cinza

Cinquenta Tons de Cinza foi publicado originalmente como uma fan fic inspirada em Crepúsculo. A escritora E.L. James buscou uma versão erótica no relacionamento entre o vampiro Edward Cullen e a humana Bella Swan, agora representada nas figuras de Christian Grey e Anastasia Steele. Uma trilogia foi escrita e rendeu mais de 100 milhões de exemplares e agora a primeira obra é adaptada ao cinema por Sam Taylor-Johnson.

A trama segue Anastasia Steele (Dakota Johnson), uma estudante de literatura que, a pedido de uma colega que se encontra doente, aceita realizar uma entrevista com Christian Grey (Jamie Dornan), um bilionário de 27 anos, solteiro e cobiçado. Seu lado misterioso logo atrai a jovem, que não demora muito para se encantar pelo rapaz, que retribui da mesma forma. Contudo, Grey revela um segredo: a prática BDSM, popularmente conhecida como sadomasoquismo. Inicialmente, qualquer mulher sem nenhuma experiência sexual, como Anastasia, fugiria daquele sujeito. Mas a baixa autoestima e a tendência autodestrutiva visivelmente transparecidas na jovem, fazem com que ela se interesse ainda mais por Christian, que desde o primeiro encontro deixa bem claro suas reais intenções: total submissão e prazer próprio.

Tendo como pano de fundo o feitiche e o erotismo, embora a adaptação ao cinema esteja sendo vendida como um romance (o longa estreou no Dia dos Namorados americano), não confundam logo de início a história como uma comédia. Embora representada como uma pessoa ingênua e inocente, a atuação de Dakota Johnson fica marcada pelo tom cômico e com uma certa safadeza (vide a frequente mordida nos lábios ao olhar para Christian com desejo).

Sinceramente não me surpreendi que uma garota que demonstra desleixo com o visual (assim como Bella Swan) se interesse pela primeira pessoa bem vestida, de boa aparência e rica que lhe dê atenção. Grey enxerga na garota comum e que ninguém sentiria atração uma resposta para seus problemas emocionais e psicológicos, enquanto a jovem se rebaixa e aceita ser tratada como um mero objeto sexual.

O roteiro de Kelly Marcel é bastante complicado de compreender ao deixar evidente a confusão sobre o filme ser um romance, erótico ou uma comédia romântica, porque os próprios atores não se levam a sério e fazem parecer uma comédia na maioria das cenas. Dornan mais parece um canastrão que se aproveita das suas condições para se satisfazer do que um sedutor e atraente classificado no livro. Além disso, o longa tem um problema sério em não saber representar de verdade o que é um feitiche.

Tanto no livro quanto na adaptação o que acompanhamos é uma série de abusos sofridos por Anastasia. A relação BDSM busca o prazer para ambos os parceiros e de forma consensual. Aqui, a jovem é obrigada a assinar um contrato imposto por Grey e seguir cada cláusula. Conservadorismo e a mulher sendo um objeto para render prazer ao homem. O longa nada mais é do que um triste conto machista, embora escrito por uma mulher.

Erotismo de verdade está no ótimo Secretária, longa de 2002 estrelado por Maggie Gyllenhaal e James Spader, que por grande “coincidência” também apresenta um Grey como protagonista. O que vemos no longa é uma verdadeira relação BDSM em que ambos buscam o prazer durante suas relações muito bem representadas em cena, o que é diferente aqui.

Cinquenta Tons de Cinza apresenta cenas de sexo mecânicas e sem nenhuma inspiração. Faltou aquele tom de sensualidade e o longa deixa bem claro que apenas Grey está sentindo prazer. A produção tinha todos os requisitos para criar uma bela sequência erótica e até de romantismo, mas quem espera algo sensual ou excitante vai sair deveras decepcionado. Há mais ou menos 30 anos atrás, Top Gun e 9 ½ Semanas de Amor apresentaram sequências de sexo com mistura de erotismo e feitiche com dois casais apaixonados. Nesta versão 2015, vemos uma jovem ser abusada por um sujeito egoísta e, por incrível que pareça, milhares de mulheres no mundo acham isso excitante.

Ok, Grey tem um passado traumático de abusos em uma cena de justificativa pobre quando o bilionário tenta explicar os motivos de querer controlar tudo. Mas, não quer dizer que por isso ele precisa abusar de Anastasia e de outras jovens com que se relacionou. Sim, ele revela que outras garotas participaram de suas provações e que a jovem estudante era apenas mais uma.

No mais, Cinquenta Tons de Cinza é um longa de narrativa pobre com diálogos pra lá de clichês. Em alguns momentos, chega a ser engraçado algumas cenas que não deveriam ser cômicas, mas as circunstâncias a fizeram com que fossem. O grande exemplo é o fato de Christian ser um stalker e perseguir Anastasia a todo instante.

Inocentemente eu esperava gostar da adaptação e ver uma interessante obra contemporânea sobre erotismo. Porém, o resultado foi negativo e frustante. Nunca vou esquecer da vergonha que senti ao ver Grey disparar a seguinte frase: “Eu não faço amor. Eu fodo. Com força”. E o pior, mulheres se deliciando com isso.

Engraçado que Emannuelle e tantos outros filmes de soft porn durante os Cine Privé e nas sessões da Multishow são taxados como machistas pelo público feminino, quando na verdade são bem mais românticos e criativos do que este longa que não tem nada de romântico, nada sensual e nada feitichista.

  • Ruim
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Resumo

Inocentemente eu esperava gostar da adaptação e ver uma interessante obra contemporânea sobre erotismo. Porém, o resultado foi negativo e frustante. Nunca vou esquecer da vergonha que senti ao ver Grey disparar a seguinte frase: “Eu não faço amor. Eu fodo. Com força”. E o pior, mulheres se deliciando com isso.

  1. Ah! eu curti, não li o livro e achei o filme bem confuso, maaaas adorei a Dakota, o cara nem tanto, mas foi bem melhor do que imaginava. Eles podiam ter explorado mais o fetichismo…

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