Crítica | A Favorita mostra ambição feminina de forma divertida

No século XVIII, a Rainha Anne, a última representante da família Stuart, ocupava o trono Britânico. No ano de 1711 ela nomeou uma camareira chamada Abigail Hill para ser a Guardiã da Bolsa Privada (uma espécie de tesoureiro real ou secretário de finanças), que começou a reverter a fortuna Sarah Churchill, a duquesa de Marlborough, que até então era a conselheira mais próxima da rainha e até mesmo fez com que Sarah fosse expulsa da corte. Foi esse pedacinho da história que serviu de base para A Favorita, a nova comédia de Yorgos Lanthimos.

Ao contrário dos muitos filmes de época que estamos acostumados a ver, A Favorita foge do drama clássico e mostra uma fantasia bastante afiada e absurda, fazendo uma sátira sobre a realeza que diverte ao mesmo que tempo que desagrada, bem ao estilo bizarro e cínico do diretor grego que ficou conhecido por filmes como O Lagosta e O Sacrifício do Cervo Sagrado.

A corte da Rainha Anne é povoada por pessoas vaidosas, que passam o dia fofocando, fazendo brincadeiras sexuais, assistindo corrida de patos ou treinando tiros. Mas mesmo com uma Rainha e várias mulheres buscando poder, o patriarcado domina o reino. O que não faz com que as mulheres sejam passivas ou inocentes, muito pelo contrário. O enredo de A Favorita se baseia nos esquemas, manipulações e traições entre as três personagens principais: Anne (Olivia Colman), a rainha atormentada por suas doenças que comanda um jogo político e erótico com Abigail (Emma Stone) e Sarah (Rachel Weisz).

Sarah conhece a rainha desde que as duas eram crianças e além de ser sua amante, é também sua conselheira em assuntos de governo. A Rainha deixa que sua amiga cuide dos negócios, incluindo as decisões relacionadas à guerra entre a Inglaterra e a França que serve como plano de fundo para o filme, desde que ela durma com a monarca. Já Abigail é uma jovem prima de Sarah que chega ao palácio em busca de trabalho, pois perdeu seus títulos de nobreza e posses – apesar do jeito doce, ela é cheia de ambição, o que a leva a fazer uma aliança com o chefe da oposição do governo Robert Harley (Nicholas Hoult) para conseguir o que deseja. Aos poucos, Abigail vai conquistando o afeto (dentro e fora da cama) e proteção de Anne, o que faz com que ela se torne uma rival de Sarah.

Todos na corte se utilizam de seus status para obterem favores e não hesitam em humilhar os outros. A rainha é a uma criatura frágil desse lugar, com suas doenças e neuroses, que a fazem parecer completamente despreparada e até meio patética, se tornando um alvo fácil para a manipulação dos interesseiros.

Rachel Weisz (Desobediência) e Emma Stone (La La Land) estão ótimas no longa. Weisz mantém um ritmo gélido e condescende durante todo o longa, já Stone faz uma garota que parece fofa, mas que está apenas maquinando seus planos. O destaque certamente é Olivia Colman (Broadchurch). Em uma performance digna de premiações, ela consegue ser trágica e cômica ao mesmo tempo, sendo, possivelmente, a única personagem sincera do longa. No início somos levados a crer que Anne é apenas uma monarca mimada, então vamos descobrindo todas as suas camadas e todas as suas cicatrizes.

O roteiro de A Favorita é da estreante Deborah Davis e Tony McNamara (Doctor Who), mas é a sagacidade de Lanthimos que dá o tom do filme. Assim como seus trabalhos anteriores, A Favorita não é um filme convencional, o que pode ser percebido desde a trilha sonora até as cenas filmadas com lentes grande angular. O figurino e a direção de arte fizeram um belo trabalho com o visual completamente exagerado, extravagante e luxuoso da Inglaterra do Século XVIII.

A Favorita é um filme que destaca a força feminina e faz com que o público pense em suas próprias ações. Afinal, quem não gostaria de ter poder e desfrutar as coisas boas da vida? Onde nossa ambição pode nos levar? Além disso, temos toda uma distorção dos clichês dos filmes de época e muito humor.

Olivia Colman recebeu o prêmio de melhor atriz em filme de comédia no Globo de Ouro e no Critics’ Choice Awards. A Favorita levou o prêmio de melhor elenco no Critics’ Choice e foi indicado em dez categorias do Oscar 2019: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Atriz, Melhor Atriz Coadjuvante (duas indicações), Melhor Roteiro Original, Melhor Fotografia, Melhor Figurino, Melhor Montagem e Melhor Design de Produção.

A Favorita está em cartaz no cinemas brasileiros.

4

Ótimo

A Favorita faz uma sátira muito bem humorada da realeza enquanto destaca a força e a ambição feminina, levando o público a questionar suas próprias ações e decisões em relação ao poder.