A Favorita Do Rei | Crítica

A Favorita Do Rei foi destaque no Festival de Cannes porque rendeu sete minutos de aplausos após ser exibido na abertura da 76ª edição e porque trouxe consigo algumas polêmicas envolvendo suas estrelas. O longa foi o responsável pelo retorno de Johnny Depp às telas após um período de muitas controvérsias com a ex-esposa, Amber Heard. Enquanto isso, a diretora, roteirista e protagonista do filme, Maïwenn, também estava no meio de um processo após agredir um jornalista francês.

O filme, que chega aos cinemas brasileiros no dia 28 de novembro, conta a história de Madame Jeanne du Barry (Maïwenn), a amante de origem humilde do Rei Luís XV (Johnny Depp), da França. Por ser encantadoramente sensual, se tornou a favorita do monarca. O rei era escandalosamente apaixonado por ela e isso permitia com que sua amante principal tivesse luxos e algumas liberdades negadas aos outros membros da Corte. A produção oferece uma visão relativamente provocativa do que se passava em Versalhes, embora seja inofensivo em comparação com outras produções sobre o palácio mais famoso da França.

A protagonista de A Favorita Do Rei começou sua vida como Jeanne Bécu, filha ilegítima de uma cozinheira e de um padre. Para que a jovem não tivesse contato com os males do mundo e tivesse algum tipo de educação, foi colocada em um convento. No filme, Jeanne é expulsa por ler romances picantes e aos quinze anos precisou arrumar formas de conseguir renda para se manter. Após passar por uma série de trabalhos, encontrou seu lugar em um bordel de luxo. No prólogo, que mostra os primeiros anos de vida, a personagem é interpretada brevemente por Emma Kaboré-Dufour e Loli Bahia.

Por conta de sua beleza e de seu cérebro, Jeanne passou a atrair clientes poderosos, incluindo o proprietário do local, Jean-Baptiste du Barry (Melvil Poupaud). Ele ajudou a estabelecer a carreira de Jeanne como cortesã nos mais altos círculos da sociedade parisiense, incluindo a aristocracia. Então, foi decidido que ela deveria ser apresentada ao rei, como uma forma de elevar as condições de vida de ambos. Após ser submetida a uma horrível inspeção ginecológica pelos médicos reais, Jeanne é admitida na presença real e as coisas prosseguem de forma bastante satisfatória.

Jeanne é uma cortesã sexy e inteligente que lê livros o tempo todo, inclusive no banho. Além disso, ela não era o tipo de mulher que fazia o que lhe mandavam. Ninguém deve dar as costas ao rei, mas ela o fez mesmo assim. Eles avisaram que ela não deveria olhar Luís XV diretamente nos olhos, para que outros não tomassem isso como “um convite”, mas ela também ignorou os conselheiros de Versalhes, encarando desafiadoramente o olhar do rei. Mas ela é inteligente o suficiente para saber quais são as regras, quando quebrá-las e quando seguir as convenções. Essa personalidade, junto com sua beleza, é o que fazem com que o rei se apaixone por ela.

Porém, esse comportamento, somado ao baixo nascimento e ao senso estético diferenciado da amante do rei, enfurece a Corte. A maioria deles se opunha fortemente a ela e a considerava indigna da atenção que recebia. Especialmente as filhas adultas do rei (India Hair, Suzanne de Baecque, Capucine Valmary) com a falecida rainha, que são retratadas em A Favorita Do Rei como uma espécie de irmãs feias da Cinderela.

Mas a maior pedra no sapato de Jeanne está para chegar. Quando o Delfim (Diego Le Fur), que mais tarde se tornaria Luís XVI, apresenta sua noiva, Maria Antonieta (Pauline Pollman), ela se recusa a reconhecer Jeanne na Corte, talvez irritada pelo fato da amante do rei ter usado branco para ofuscá-la em Versalhes ou talvez por ter acreditado nas fofocas de outros aristocratas. Com o declínio da saúde do rei, a base de poder de Jeanne diminui e a calamidade se aproxima.

Johnny Depp leva seu papel como o Luís XV, falado inteiramente em francês, a sério, mas o filme não lhe dá muito com o que trabalhar como personagem, além dos sorrisinhos e reviradas de olhos de quem não aguenta mais toda a ladainha de Versalhes, que nos mostram porque se sentiu tão atraído pela irreverente Jeanne. Ainda que fale o idioma bem, as falas de Depp são bem contidas, muitas delas murmuradas. Em um país que é tão apegado à língua e tradições, é uma escolha inusitada ter um ator dos Estados Unidos como a figura máxima da monarquia. Depp é adequado, discreto e composto, mas não traz nada que fique em nossas memórias, como alguns de seus personagens anteriores mais divertidos.

Maïwenn, com sua autoestima muito bem trabalhada para se colocar no papel da que foi considerada uma das mulheres mais bonitas da França, faz com que Jeanne du Barry não seja tratada como uma mera cortesã em seu filme, mas uma estrategista que conseguiu conquistar não apenas o rei, mas uma boa parcela do poder e riqueza que o acompanham. Como atriz, ela faz um trabalho razoável que a possibilitou mostrar uma gama de emoções. Mas, ainda que ambos os protagonistas trabalhem bem, não há muita química nesse casal.

Em questão de roteiro, os que gostam de precisão histórica podem se decepcionar, já que são tomadas uma série de liberdades artísticas durante essa trama. Jeanne parecer ser muito mais à frente de seu tempo do que provavelmente era. Além disso, a verdadeira Jeanne supostamente era uma loira de aparência angelical com cachos e olhos azuis. Pouco disso descreve Maiwenn, que também é cerca de vinte anos mais velha do que a verdadeira Jeanne quando conheceu o rei Luís XV.

Além disso, a verdadeira Madame Jeanne du Barry era conhecida por ser extremamente extravagante, já em A Favorita Do Rei as filhas do rei chamam muito mais atenção nesse quesito, já que Jeanne muitas vezes está com vestidos mais simples e sem peruca. Também era conhecida por ser lasciva e no filme, as partes sexuais e mais sensuais são bastante contidas. Jeanne  provavelmente nunca foi uma figura tão feminista, não chocava a corte com roupas masculinas ou tinha uma amizade com um garoto negro escravizado que ganhou de presente.

No geral, o filme é bem feito, com algumas boas atuações e oferece entretenimento como um drama de época polido e bonito, embora seja uma aula de história imperfeita e um tanto quanto tímido para uma produção sobre uma paixão transformadora, envolvendo uma figura tão provocativa. Ainda assim, traz figurinos luxuosos e lindos, acompanhando a beleza das locações e cenários de época maravilhosos, que incluem o próprio Palácio de Versalhes. O design de produção é meticuloso e exuberante, trabalho de Angelo Zamparutti, capturado com pelo diretor de fotografia Laurent Dailland, que torna A Favorita Do Rei agradável aos olhos.

Com distribuição da Mares Filmes e Alpha Filmes, A Favorita Do Rei estreia exclusivamente nos cinemas brasileiros no dia 28 de novembro.

3

Bom

Ainda que tome uma série de liberdades artísticas que fogem dos relatos históricos e seja um filme bastante contido, apesar de se tratar de uma personagem conhecida por sua sensualidade, A Favorita Do Rei é belíssimo visualmente e serve como um bom entretenimento.